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samedi 28 mai 2011

Especialização e Ideologia



Anotações sociológicas
Por
Jacob (J.) Lumier



Separação do trabalho intelectual

Em Lukacs podemos notar um posicionamento mais coerente com o realismo, e a ideologia é tratada como aspecto da estrutura social e do todo social que lhe é subjacente. No estudo já citado aqui[i] esse autor caracteriza a ideologia burguesa em dois períodos: o clássico e o da decadência, nos quais é questão de “respostas aos problemas que suscita o desenvolvimento do capitalismo”.
No período clássico, há uma “resposta sincera e científica embora incompleta e cheia de contradições”, enquanto na decadência há uma “evasão” diante da realidade, evasão essa disfarçada seja de cientificidade objetiva ou de originalidade romântica, ambas provenientes de uma atitude “a-crítica”.
A ideologia é assim tratada como conhecimento político e posta em perspectiva sociológica, referida aos quadros sociais nos quais entra em correlações funcionais, como matéria de sociologia do conhecimento.
A ideologia burguesa da decadência é cotejada e integrada no conjunto da divisão do trabalho em regime capitalista, isto é, posta em correlações funcionais com o todo social que impulsiona a estrutura de classes.
Duas situações são distinguidas, duas regularidades tendenciais: 1) - o divórcio entre o campo e a cidade e, 2) - a separação entre o trabalho físico e o trabalho intelectual.
Será com referência a essas duas regularidades tendenciais no conjunto da divisão do trabalho em regime capitalista que Lukacs analisará a atitude acrítica do conhecimento político da burguesia em suas representações de cientificidade e de romantismo.
Nota ademais que a separação do trabalho intelectual leva a tipos particulares de especialistas com sua psicologia peculiar, como a psicologia dos juristas, dos técnicos, etc. e que essa separação vai além da estrutura de classes, constituindo um elemento do próprio tipo de fenômeno do todo da sociedade capitalista concorrencial e de sua estrutura global.
Quer dizer, a separação do trabalho intelectual aprofunda-se de tal maneira que penetra na “alma” de cada homem, e provoca fundas deformações.
Não de maneira abstrata, mas, por sua vez, tais deformações aparecerão posteriormente.
Ou melhor, as deformações de separação do trabalho intelectual aparecem efetivamente de diversas maneiras nas distintas manifestações ideológicas, notadamente, no âmbito desses grupos sociais mais humanos como a família, os grupos locais, as oficinas e fábricas.

Romantismo e Preconceito Político

Entretanto, o que constitui problema para Lukacs é a consciência da liberdade humana em face dessa engrenagem ou determinismo sociológico da sociedade de tipo capitalista concorrencial; é a capacidade de rebeldia ou de não-aceitação desses efeitos deformadores da divisão do trabalho (a privatização da vida, a subjetividade vazia), já que são esses efeitos, ou melhor, a submissão passiva aos mesmos, notadamente a decoração dessas “deformações morais e anímicas”, o que se denuncia no “pensamento decadente”.
Mas não se trata de mera representação. O pensamento ideológico desse tipo decadente se manifesta com expressão de romantismo, lá onde se toma a especialização cada vez mais estreita pelo que deve ser o “destino da nossa época”.
Quer dizer, trata-se de um conhecimento político da burguesia, uma estratégia que "justifica dissimulando e dissimula justificando", no âmbito da qual Lukacs integrará o movimento da filosofia neokantiana e, também em torno de Max Weber, o formalismo, tanto em sociologia como em economia.
Mas não é tudo.  Ressalta que se trata de uma atitude de submissão cuja expressão política é calcada na “evasão apologética” diante da realidade social, de tal forma que a aceitação da especialização estreita leva às declarações preconceituosas de que “o direito ao produto íntegro do trabalho é uma utopia irrealizável" – preconceito anti-social que Lukacs atribui a Weber (ib.p.53).
Tal a abordagem do pensamento ideológico pela sociologia do conhecimento na obra de um pensador marxista representativo do século XX.




[i] Lukacs, Georges: ‘Marx y Weber: reflexiones sobre la decadencia  de la ideología’, in Horowitz, Irwin L.: ‘Historia y Elemientos de la sociología del conocimiento - tomo I’, artigo extraído de Lukacs, G.: ‘Karl Marx und Friedrich Engels als Literaturhistoriker’, Berlim, Aufbau, 1948; tradução Carlos Guerrero, Buenos Aires, Editora da universidade de Buenos Aires (Eudeba), 3ªedição, 1974, pp.49 a 55.

mardi 11 août 2009

O Desvio da Sociologia do Conhecimento na Obra de Karl Mannheim

O DESVIO DA SOCIOLOGIA DO CONHECIMENTO NA OBRA DE KARL MANNHEIM


POR

JACOB (J.) LUMIER


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Alguns estudiosos dizem-se críticos da sociologia do conhecimento e preterem sua relevância pedagógica como disciplina científica porque equiparam-na indevidamente ao behaviorismo e às abordagens meramente psicológicas do conhecimento.

Via de regra atribui-se como representativa a proposição exagerada de que a “validade das teorias científicas pode ser reduzida aos interesses que desempenharam um papel na sua geração”, como se a sociologia do conhecimento adotasse uma axiomática da causalidade.

Desta forma cultiva-se uma imagem restrita da nossa disciplina, tida equivocadamente como exclusivamente causal, imagem esta que, em toda a evidência, tem a ver com uma simplificação imprópria da sociologia do conhecimento identificada ao neo-hegelianismo de Karl Mannheim.

Autor muito influente nos Estados Unidos[1] com sua obra Ideologia e Utopia [2] e sua compreensão de que todo o conhecimento é ligado a questões práticas, Mannheim comprometeu seu pragmatismo.

Além disso prejudicou a autonomia e o prestígio científico da sociologia do conhecimento de que ele foi o mais notado incentivador na primeira metade do Século Vinte ao elaborar um enfoque inteiramente baseado na concepção hegeliana conservadorista, tomando o saber como instrumento de adaptação do mundo dos valores ideais às situações existentes ao longo da história.

Trata-se de uma posição filosófica preconcebida submetendo o princípio de sua sociologia que, ao contrário do que se poderia conjecturar, afirmava a determinação social do pensamento em razão do hegelianismo e não em resultado das pesquisas concretas.

Mas não é tudo. Combinada a essa concepção do saber, tido por meio de adaptação dos ideais como conjunto das obras de civilização (incluindo a arte, religião, direito, moralidade, educação, e o próprio conhecimento), Mannheim faz por segregar sua célebre representação de um sujeito com plena ciência desta faceta instrumental do conhecimento.

Vale dizer, projetando uma ciência desse saber adaptando às situações existentes na história, Mannheim se representa um “estrato desamarrado, relativamente sem classe” por ele chamada “intelligentsia socialmente desvinculada” capaz de salvaguardar a perspectiva do todo e o interesse pelo todo – em realidade um todo previamente alcançado com a tomada de posição filosófica pró hegelianismo.

Ademais, cabe notar que esse posicionamento recusando as amarras sociais como desfavoráveis a um saber do todo faz lembrar a pesquisa social sobre o sentimento de imperfeição do mundo nas classes subalternas, comentada por Max Weber [3].

Por uma abordagem ou por outra, pelo viés da concepção conservadora do saber ou pelo desvio da recusa de amarras sociais, a verdade é que não se pode aplicar a sociologia de Mannheim sem levar em conta o problema crítico cultural da transposição do hegelianismo ou do conservadorismo hegeliano em ideologia revolucionária no século 20, do que o melhor exame foi proposto por Ernst Cassirer em “O Mito do Estado[4] .

Em suma, à luz da nova sociologia do conhecimento proposta por C. Wright Mills e desenvolvida por Georges Gurvitch, sobressai que o neo-hegelianismo de Mannheim levou ao fracasso sua orientação, absolutamente inaproveitável em uma sociologia comprometida com a explicação das questões públicas.

(continua)


[1] Gurvitch, Georges (1894-1965): “Problemas de Sociologia do Conhecimento”, In Gurvitch (Ed.) et Al. ”Tratado de Sociologia - Vol.2”, Trad: Ma. José Marinho, Revisão: Alberto Ferreira, Iniciativas Editoriais, Porto 1968, Págs.145 a 189 (1ªedição Em Francês: PUF, Paris, 1960). Cf.pág. 161.

[2] Mannheim, Karl: « Ideologia e Utopia: uma introdução à sociologia do conhecimento », tradução Sérgio Santeiro, revisão César Guimarães, Rio de Janeiro, Zahar editor, 2ªedição, 1972, 330 pp. (1ªedição em Alemão, Bonn, F.Cohen, 1929; 2ªedição remodelada em Inglês, 1936).

[3] Wrigth Mills, C. e Gerth, Hans - Organizadores : « Max Weber : Ensaios de Sociologia », tradução Waltensir Dutra, revisão Fernando Henrique Cardoso, 2ªedição, Rio de Janeiro, Zahar, 1971, 530 pp.(1ªedição em Inglês : Oxford University Press, 1946). Cf.págs.318 sq e 409 sq.

[4] Cassirer, Ernst: “O Mito do Estado”, trad. Álvaro Cabral, Rio de Janeiro, Zahar editor, 1976, 316 pp. (1ªedição em Inglês, Londres, 1946).

vendredi 22 mai 2009

Crítica da aplicação do paradigma de Hobbes em Teoria sociológica.


Mistificando a falsa questão elucubrativa sem resposta de "como a sociedade é possível", Dahrendorf nos deixa ver com clareza, malgrado seu posicionamento, que, por estar amarrada a preocupações “axiomáticas”, a filosofia social inviabiliza o aprofundamento da microssociologia e, por esta via, abisma a própria teoria sociológica que pretende tecnificar.

***

O pluralismo social efetivo estudado no realismo relativista dialético sociológico, como dinâmica característica dos elementos microssociais, não se deixa confundir aos posicionamentos pseudopluralistas no plano das técnicas políticas, elaboradas pelos adeptos das chamadas teorias de coação, que favorecem a tecnoburocracia e não são democráticas nem orientadas para os direitos humanos.

Em microssociologia estudam-se as relações com outrem por afastamento, as relações mistas, as relações por aproximação.

As relações com outrem são observadas (a) - como as relações variáveis que se manifestam entre os Nós, entre os grupos, entre as classes, entre as sociedades globais; (b) - como as relações que, em acréscimo, variam com a oposição entre sociabilidade ativa e sociabilidade passiva, sem todavia deixar de manter sua eficácia de conjuntos ou de quadros sociais, já que são os componentes não-históricos ou anestruturais fundamentais na estruturação dos grupos.

Deste ponto de vista, em cada unidade coletiva real se encontram os Nós e as relações com outrem em maneira espontânea, que são utilizadas pelas unidades coletivas para se estruturarem na medida em que o grupal e o global imprimem a sua racionalidade mais ou menos histórica e a ligação estrutural a essas manifestações microscópicas da vida social.

Vale dizer: as manifestações da sociabilidade são hierarquizadas do exterior ou de fora para dentro, sem perderem sua característica anestrutural. É essa experiência dialética que tornam as relações humanas tão problemáticas, variáveis e escorregadias para a tecnocratização dos controles.

As relações com outrem não podem ser identificadas nem às fases históricas da sociedade global, nem aos agrupamentos particulares. E isto é assim porque a diversidade irredutível dos Nós faz com que tais manifestações da sociabilidade por relações com outrem não admita síntese que ultrapasse a combinação variável dessas relações microscópicas, como espécie de sociabilidade.

Quer dizer, mesmo no estado muito valorado pelos estudiosos da história social, quando as relações com outrem são distribuídas hierarquicamente e servem de pontos de referências a uma estrutura social (relações com o Estado, relações com a classe empresarial, relações com os estratos dominantes, com os estratos intermediários, com os produtores, etc.) a síntese não ultrapassa o estado de combinação variável. É pela microssociologia que se põe em relevo a variabilidade no interior de cada grupo, de cada classe, de cada sociedade global.

►Por sua vez, nos chamados posicionamentos pluralistas como técnicas políticas há um afastamento do antidogmatismo próprio à sociologia diferencial e os autores dessas "teorias de coação" se permitem misturar erroneamente certas formulações sociológicas às projeções de filosofia social.

Tal é o procedimento que lemos nos escritos de Ralf Dahrendorf, haja vista a assimilação do pluralismo dos contrapoderes a uma teoria da coação, de tal sorte que as mudanças nas estruturas sociais passam a ser atribuídas a uma discursiva dialética do poder e da resistência.

Nessa concepção, seriam as posições que permitem a seus ocupantes exercer o poder, posto que dotadas de soberania: os homens que as ocupam estabelecem a lei para seus súditos, com o aspecto mais importante do poder sendo o controle de sanções, a capacidade de garantir a conformidade à lei.

Dessa noção de poder e de sanções deve-se concluir (1) - que há sempre resistência ao exercício do poder (cuja eficiência e legitimidade são precárias); (2) - que o grupo dos que ocupam as posições de poder é o mais forte, e (3) - a sociedade se mantém unida pelo exercício de sua força, isto é, pela coação. É a suposta “solução hobbeseana para o problema hobbeseano da ordem”.

Dessa forma, o exame das estruturas vem a ser reduzido ao advento de uma estratificação identificada ao falso problema da origem das desigualdades entre os homens, deixando-se a variabilidade das múltiplas hierarquias sociais efetivas à margem de toda a análise.

►Com efeito, nas antípodas do realismo sociológico em sua visão de conjuntos práticos não-inertes, a “teoria da coação” distancia-se da compreensão positiva da sociedade, como macrocosmos de agrupamentos e formas de sociabilidade em vias de integração relativa, para tombar na posição tecnocrática (visa tecnificar ou tecnocratizar a teoria sociológica mediante aplicação de modelos axiomáticos, com os esquemas prévios substituindo a explicação sociológica descoberta a posteriori na realidade social).

Tendo criado uma alternativa no âmbito do funcionalismo, menos confusa do que as alentadas elucubrações de Talcott Parsons, a teoria da coação alcançou forte influência com sua aplicação da concepção conjectural das teorias científicas desenvolvidas por filósofos da ciência como Karl Popper.

Muito marcada pelo trauma histórico do século XX, a teoria da coação propôs-se exatamente verificar um mistificado “modelo de conflito" na vida das sociedades industriais, desenvolvendo para este fim uma reflexão orientada para a filosofia social e centrada na insustentável separação da análise estrutural e da análise histórica: a primeira seria baseada na análise de papéis sociais e interesses dos papéis, sendo assim largamente formal, enquanto que a outra, sendo análise histórica, trataria de grupos reais e seus objetivos reais, sendo conseqüentemente substantiva e não formal (ib.p.170).

Vale dizer, se no realismo sociológico prevalece a idéia de justiça como tentativa de realizar a reconciliação prévia, a teoria da coação em seu dogmatismo reduz a justiça à força.

Mistificando a questão elucubrativa sem resposta de "como a sociedade é possível" e mesmo admitindo que estruturas e instituições têm uma dimensão social microscópica (ib.p.148), Dahrendorf nos deixa ver com clareza, malgrado seu posicionamento, que, por estar amarrada a preocupações “axiomáticas” sobre “a grande força” que supostamente acarreta a mudança nas estruturas, a filosofia social inviabiliza o aprofundamento da microssociologia e, por esta via, abisma a própria teoria sociológica.

Vale dizer, o conflito social dos grupos de interesse deixa de ser um aspecto da realidade social para se tornar “a grande força” mistificada do discurso axiomático.
Daí a contradição da filosofia social ao propor que a consciência dos problemas não é apenas um meio de evitar a deformação da realidade por uma preconcepção (“biais ideológico”), mas, sobretudo, é uma condição indispensável do progresso em qualquer disciplina da investigação humana (ib.p.144).

Contradição porque a busca de uma axiomática a que serve a filosofia social é dogmatismo -no sentido em que se fala de dogmas jurídicos e dogmas religiosos- e, como se sabe, em realismo sociológico o dogmatismo exclui o progresso científico!
Em face da microssociologia mostra-se inaceitável a sugestão de que a existência de normas e a necessidade de sanções poderiam ser consideradas como pressupostos axiomáticos que dispensariam uma análise maior! (ib.p.196).

Menos de uma análise sociológica, o propósito Dahrendorf fora ideológico e tivera em vista justificar o posicionamento da filosofia social que se projeta desde Thomas Hobbes, a saber: porque há normas e porque as sanções são necessárias para impor conformidade à conduta humana (diferenciação avaliadora), tem que haver desigualdade de classes entre os homens (ib.ibidem).

Em contrapartida e em favor da indispensabilidade da microssociologia deve-se responder que, da mesma maneira em que é impossível a separação da análise histórica e da análise estrutural, a variabilidade da estratificação social é real, sua compreensão exige a microssociologia que não pode ser eludida.

***

►Mas não é tudo. À maneira dos sociólogos que valorizam a psicologia social em detrimento da microssociologia e a contrapelo da sociologia do conhecimento Ralf Dahrendorf constrói seu conceito de grupo de referência no marco da psicologia social e, por isso, encontra muitos embaraços para sustentar seus enunciados sociológicos.

Liga-se ele à corrente de outro sociólogo influente no século XX, Robert K. Merton, quem faz uso direto da psicologia social na definição do conceito operativo de grupo de referência.

A diferença é que, do ponto de vista psicológico, tais grupos de referência são tidos como “grupos de fora funcionando como padrões de valores”, enquanto Dahrendorf nega que sejam arbitrariamente escolhidos.

Seu dogmático raciocínio afirma que os grupos de referência são aqueles com os quais o indivíduo tem uma relação necessária (?!) em virtude de suas posições sociais, o que o leva ao enunciado de que “todo o segmento de posição (estratos sociais diferenciados pela distribuição de prestígio e autoridade) estabelece uma relação (necessária) entre o ocupante da posição e um ou mais grupos de referência”.

À continuidade, então, fica estabelecido “um conjunto de grupos de referência, cada um dos quais impõe ordens e é capaz de sancionar o comportamento da pessoa”, seja positivamente, seja negativamente. Desata sorte, esse autor entende que a questão da natureza da sociedade se transforma noutra questão: como os grupos de referência formulam e sancionam as expectativas das posições que definem?

Então, podemos ver que a indicada “relação necessária” tomada independentemente dos Nós e de toda manifestação microssocial surge como atributo impositivo do “segmento de posição”, em maneira exteriorizada, constituindo, em conseqüência, uma fonte de maiores embaraços do que uma ponte para boas explicações sociológicas.

Tanto que esse autor se verá, por isso, na circunstância de esclarecer sobre o grau em que os enunciados da sua célebre teoria de papéis sociais (O Homo Sociologicus) favorecem a reificação.

Com efeito, sendo uma teoria de coação, a pessoa fica constrangida a enquadrar-se na suposta “relação necessária”, que lhe é imposta por força da objetivação conceitual do grupo de referência vinculando em modo inelutável o segmento de posição a um padrão de valores previamente estabelecidos (cf.ib.pp.106/126).

Além disso, tratando restritivamente como grupo de referência os quadros sociais, Dahrendorf não percebe o alcance da microssociologia e da sociologia do conhecimento para acentuar a relativização das objetivações dos conceitos sociológicos.

Por contra, cabe lembrar o fato das coincidências entre as estimativas lógicas ou as afetivas e os quadros sociais. O alcance das correlações funcionais entre, por um lado, os quadros sociais - incluindo as formas de sociabilidade, os grupos, as classes sociais e as sociedades globais e suas estruturas-, e por outro lado os diferentes gêneros ou classes do conhecimento, tendo em conta que não se trata aqui apenas do conhecimento científico, mas de todo o juízo que pretenda afirmar a verdade sobre alguma coisa.

À vista da realidade social que, por ser compulsória e constringente, não deixa por isso de ser plena em descontinuidades, coincidências e correlações funcionais variáveis, o enunciado de que “os grupos de referência formulam e sancionam as expectativas das posições que definem”, como nos propõe Dahrendorf, só valerá em certas situações dos aparelhos organizados e em maneira relativizada, mas não por força direta da objetivação conceitual desses grupos.

Em realidade, todos os agrupamentos particulares atualizam o conhecimento em correlações funcionais que é praticado em modo variado pelos participantes (regulamentação ou controle social pelo conhecimento).

A suposta “determinação” de que grupos de referência formulam e sancionam as expectativas ou o comportamento das pessoas, exclui a dependência que os participantes têm do conhecimento de outro, dos Nós, dos grupos, das classes, das sociedades, e até mesmo exclui dentre outros gêneros do saber, a dependência do conhecimento político.

As expectativas de papéis não se reduzem às imagens cristalizadas em regulamentações prévias, mas configuram realidades coletivas complexas e variadas que aí estão em dinâmicas de avaliação, implicando o conhecimento, a moral, o direito, a educação etc. como controles ou regulamentações sociais em vias de se fazer com sedes em tipos diferentes e conflitantes de agrupamentos, classes e sociedades globais.

Além disso, a acentuação da dependência ao fenômeno social de conjunto, a eficácia das correlações funcionais entre o conhecimento e os quadros sociais, como qualidades que se expressam umas pelas outras, tem prioridade no estudo das expectativas de papéis sociais.

***
Leia Mais: Direitos Humanos e Sociologia

mercredi 18 mars 2009

Perfil de Saint-Simon - 2

Perfil de Saint-Simon - 2

Sumário:

Saint-Simon em sua época

Saint-Simon e a nova criação intelectual do século XIX

Saint-Simon e a Fisiologia Social

Saint-Simon e o Socialismo

O otimismo de Saint-Simon

Contra a tecnocracia opressiva

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Saint-Simon em sua época

La obra de Saint-Simon, escrita entre 1802 y 1825, se sitúa exactamente en este período decisivo de la historia intelectual europea (...) que significó el abandono de la forma de pensamiento propia al siglo de las luces, y la instauración de esta estructura intelectual que, al convertir al hombre en el objeto de un conocimiento científico, hizo posible la aparición de las ciencias sociales.

Durkheim, en su reflexión sobre la historia de las ciencias sociales, fue el primero que aportó una nueva interpretación de Saint-Simon y que subrayó la considerable importancia de sus obras en la creación de las ciencias sociales. Dedicó sus esfuerzos de forma particular a discutir la opinión generalmente aceptada que atribuía a Auguste Comte la fundación de la sociología, y a demostrar que sería mucho más exacto atribuir esta paternidad a Saint-Simon. Antes de pasar a las formulaciones del Curso de filosofía positiva, habría que buscar las premisas del espíritu sociológico en el pensamiento de Saint-Simon.

Estos dos aspectos, la creación de las estructuras intelectuales propias a las ciencias sociales, y la definición de los caracteres propios a las sociedades industriales, convierten a Saint-Simon en uno de esos autores en los cuales la ciencia contemporánea encuentra algunas de sus significaciones, y nuestra sociedad, de forma singular, una cierta imagen de sí misma.

***

Saint-Simon e a nova criação intelectual do século XIX

Sin duda, la ruptura intelectual operada en los primeros años del siglo XIX no fue absoluta. Durante el Siglo de las Luces, la filosofía sensualista y la economía política de la segunda mitad del siglo habían impugnado ya la tradición racionalista y ofrecido el ejemplo de nuevas investigaciones que convertían al hombre en el objeto de un conocimiento positivo.

Pero no se había descubierto aún que la aplicación al objeto humano de una investigación científica no correspondía a una simple extensión del saber, sino que implicaba una total revisión de las formas de pensamiento y de las formas de demostración.

Los "hombres positivos", tal como los denominará Saint-Simon, deberán considerar los tipos de argumentación propios a los hombres del siglo XVIII, así como el recurso a la Naturaleza y a la razón universal, como verdaderas mixtificaciones y, en consecuencia, deberán denunciarlos sistemáticamente y rechazarlos.

El Contrato social de J.J. Rousseau les facilitará el ejemplo de una argumentación "filosófica" basada en los inconsistentes conceptos de "Naturaleza" y de "Derecho", no susceptibles de definición científica. Y cuando Marx llevará a cabo en la "Ideología Alemana" esta ruptura epistemológica, que se caracterizará por la no aceptación de la filosofía hegeliana, repetirá con idénticos argumentos este movimiento de pensamiento que algunos espíritus de principios de siglo habían iniciado contra los "metafísicos". El radicalismo de esta negativa designará al mismo tiempo la originalidad del nuevo saber y la amplitud de las nuevas investigaciones que deberán ser llevadas a cabo.

Saint-Simon se sitúa en esta transformación y en esta creación intelectual que definen una nueva epistemología. Henri Gouthier, en sus trabajos consagrados a Saint-Simon y a Auguste Comte, ha mostrado hasta qué punto Saint-Simon estuvo profundamente unido a su época, y ha puesto de relieve su capacidad de clarificación y sistematización de las intuiciones formuladas a su alrededor. Por ejemplo, la cuestión de la discontinuidad entre la forma de pensamiento "coyuntural" y la forma de pensamiento "positiva", tema que constituirá uno de los ejes principales de la reflexión de Saint-Simon, había sido formulado a su alrededor por varios de sus contemporáneos, y anteriormente por Turgot.

Asimismo, la tesis del predominio de los fenómenos económicos en las sociedades modernas, tesis que a partir del año 1816 se situará en el centro de la argumentación de Saint-Simon, había sido esbozada por diversos publicistas, entre ellos Charles Dunoyer, Viral Roux y Charles Comte, y constituía una de las principales preocupaciones de la importante revista "El Censeur Européen".

Esta intensa participación de Saint-Simon en los problemas intelectuales de su época hace que sea mayor aún nuestro interés por su obra: no se nos presenta como un autor aislado que sigue las reglas pintorescas de su imaginación, sino como un autor altamente significativo a través del cual descubrimos las líneas de fuerza de un período que fue decisivo para la constitución de nuestros métodos.

Denuncia incesantemente, en sus contemporáneos, los rastros de las viejas costumbres, la sumisión a los dogmas impuestos, la incapacidad de pensar positivamente las relaciones sociales y su evolución. Sin embargo, esta tarea crítica es tan sólo propedéutica. Saint-Simon sabe que esta verdadera ruptura intelectual que se produce entre los siglos XVIII y XIX no es sino el fin de una fase intelectual de crítica y de desorganización, y el comienzo de una fase de creación y de organización.

Con el siglo XIX, empiezan al mismo tiempo una nueva sistematización epistemológica y una fase en la cual las ciencias físicas y humanas, basándose en una coherencia de los principios, podrán hacerse acumulativas y realizar a partir de aquí un verdadero progreso.

***

Saint-Simon e a Fisiologia Social

Pero esta nueva ciencia no está hecha: si bien las ciencias de la Naturaleza se hallan muy adelantadas en el sentido de la positividad, el inmenso campo de los hechos sociales se halla todavía en manos de las creencias teológicas o de las abstracciones filosóficas. Saint-Simon proclama entonces la necesidad de crear lo que él denomina la "ciencia del hombre", o también la "ciencia de las sociedades".

A partir de 1816, y hasta sus últimos escritos, se consagrará a esta tarea: "Hacer entrar en la categoría de las ideas de física los fenómenos del orden llamado moral." (...) Este intento de Saint-Simon puede ser considerado, efectivamente, como el primer intento sistemático de creación de las ciencias sociales.

Según Saint-Simon, el observador social debe proponerse el estudio de lo que él denomina las "organizaciones sociales", a fin de mostrar la especificidad de los distintos sistemas sociales y la composición de las instituciones. Se esfuerza en mostrar el funcionamiento de las instituciones, su coherencia o su situación conflictiva, a fin de subrayar que los modelos de funcionamiento varían según los grandes tipos de organización.

El observador debe poder descubrir con su investigación las condiciones del proceso social, debe poder explicar la evolución en el pasado y ser capaz de prever las grandes líneas de las futuras transformaciones.

Más aún, Saint-Simon se ve en la necesidad de definir el objeto de la ciencia social y, al mismo tiempo, de fijar las tareas de las ulteriores investigaciones. (...) Una de las principales aportaciones de Saint-Simon fue la atribución a las ciencias sociales de un objeto definido, y el descubrimiento de la especificidad de este objeto con respecto a los objetos de las ciencias físicas y de las ciencias biológicas.

Al repetir que la ciencia social o "fisiología social" debía estudiar los sistemas sociales, que debía analizar los caracteres particulares de las "relaciones sociales" y caracterizar las distintas instituciones y sus relaciones recíprocas, no sólo estaba fijando las ambiciones de una ciencia de las sociedades, sino que la fundaba, en tanto que ciencia distinta, por la constitución de sus objetos.

Del mismo modo que la fisiología al descubrir las leyes de funcionamiento del ser vivo permite prever su evolución y, al mismo tiempo, indicar los remedios para sus males, la ciencia de las sociedades debe enunciar las grandes líneas de su evolución futura e instaurar una práctica política conducente a la reorganización de la sociedad.

La fisiología social debe, según su expresión, hacer que la política se vuelva "positiva", es decir, debe descubrir los caracteres necesarios de la nueva organización social y, por tanto, indicar los medios indispensables para lograr su advenimiento.

***

Saint-Simon e o Socialismo

Desde este momento, la reflexión desborda los problemas científicos y filosóficos, conduce a una práctica política y se fija como objetivo lo que Saint-Simon denomina la "gran revolución europea", "la revolución general", caracterizada por el advenimiento de la sociedad industrial.

Llegado a este punto, hacia los años 1820, Saint-Simon sólo podía oponerse a sus contemporáneos liberales.

Mientras se limitó a condenar el pensamiento religioso y monárquico, participó en este amplio movimiento intelectual que consideraba ya a los tradicionalistas como De Bonald o Chateaubriand como los teóricos de un pasado definitivamente muerto; pero al condenar la organización social y económica, al invitar a los productores a constituir un partido político, no podía sino escandalizar o asustar a sus contemporáneos liberales que sólo reclamaban la libertad de la actividad económica. Los escritores y publicistas liberales, Benjamin Constant, Mme. De Staél, los industriales que al principio lo habían sostenido, se apartaron de él y expresaron su total desacuerdo con un pensamiento tan peligroso.

En efecto, una de las conclusiones de Saint-Simon era que la sociedad industrial se vería obligada a transformar la naturaleza de las relaciones sociales y, en particular, a impugnar el principio de la propiedad privada. Una sociedad que tuviera como objetivo común el desarrollo de la producción se vería obligada a subordinar a este fin las reglas de la propiedad e incluso a replantear radicalmente el principio de la libertad.

(...) Estas teorías convierten a Saint-Simon en uno de los primeros teóricos del socialismo moderno.

***

O otimismo de Saint-Simon

A partir de 1820, Saint-Simon se plantea más y más preguntas acerca de la naturaleza de esta sociedad industrial. Habiendo llegado a la conclusión de que el desarrollo necesario de la industria constituirá el factor determinante de la nueva sociedad, intenta prever cuáles serán los rasgos esenciales de esta organización social desprovista de precedentes históricos. ¿Cuáles serán las instituciones de una sociedad de este tipo, y cuáles sus fuerzas dominantes? ¿Cuál será su organización política? ¿Será quizá radicalmente distinta de las organizaciones antiguas? ¿Dónde se situarán los poderes sociales y cuál será su naturaleza? ¿Subsistirán las clases sociales, y, en caso afirmativo, cuáles serán sus relaciones? ¿Cuál será la cualidad particular de las relaciones sociales?

Es evidente que Saint-Simon no podía contestar de forma exhaustiva a preguntas tan audaces en una época en que la industria francesa se hallaba todavía en la fase de las promesas. Sin embargo, su estancia en los Estados Unidos, sus conocimientos sobre la industria inglesa, suministraban materiales que se ofrecían a su imaginación sociológica.

Más aún, tal como lo ha sugerido François Peroux, Saint-Simon se sitúa en un momento

privilegiado en el cual la sociedad francesa, advertida del fenómeno industrial, se interroga sobre sus transformaciones futuras.

Sin llegar a las vías contradictorias que serán los neocapitalismos y los socialismos, Saint-Simon presiente en algunas ocasiones cuáles serán las necesidades comunes a estas diferentes sociedades, y consigue esbozar así, premonitoriamente, algunos rasgos fundamentales de nuestras sociedades.

Sin duda el optimismo de Saint-Simon respecto al destino de las sociedades industriales había de impedirle presentir sus divisiones y, por ejemplo, el mantenimiento de los conflictos militares. El desarrollo histórico de los siglos XIX y XX no ha confirmado en absoluto la predicción sansimoniana según la cual la extensión de la industria supondría la desaparición de la guerra entre naciones industriales.

***

Contra a tecnocracia opressiva

Podemos preguntarnos, si embargo, si la presencia del pensamiento sansimoniano en el mundo contemporáneo no se debe tanto a sus errores flagrantes como a sus exactitudes. Los textos de Saint-Simon sobre la urgencia del desarrollo industrial, sobre el progreso científico y técnico, sobre la necesidad de una planificación racional, sobre la necesaria participación de todos los productores en la empresa colectiva, tienen un carácter tan actual que ha podido escribirse sin paradoja que "todos somos ahora más o menos sansimonianos".

Pero las afirmaciones de Saint-Simon sobre el carácter pacífico de la industria, sobre la transparencia propia a la sociedad industrial, sobre la imposibilidad de una tecnocracia opresiva, nos llaman la atención con idéntica fuerza, sea porque se prolongan en las ideologías oficiales, sea porque vienen a designar con una singular nitidez los fracasos de las sociedades industriales.

Ello se debe a que Saint-Simon, en el origen de las sociedades modernas y antes de su desarrollo, sólo puede situarse al nivel de los principios, al nivel de las generalidades y de las síntesis. Al releer a Saint-Simon nos vemos constantemente remitidos a nuestras sociedades contemporáneas a fin de examinar en qué medida han realizado las promesas del sansimonismo y por qué, a pesar de proclamar incansablemente estos principios enunciados hace ya más de un siglo y medio, no logran realizarlas.

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Fragmentos do ensaio de Pierre Ansart intitulado SOCIOLOGÍA DE SAINT-SIMON (2002 - inclusión en la web)

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Leia

"O Conformismo como Obstáculo: perfil de Saint-simon - 3"

dimanche 8 février 2009

Perfil de Saint-Simon






Perfil de Saint-Simon[1] - I

(...) Saint-Simon, qui fut le plus réaliste des « utopistes » et le plus utopiste des sociologues, facilite lui-même cette séparation entre doctrine socio-politique et sociologie.

En effet, selon les régimes et les conjonctures, il modifie les moyens : révolutionnaire pour les régimes militaires et précapitalistes, il est réformiste pour les régimes capita­listes et post-capitalistes.

Il change d'idéal au cours des différentes étapes de sa vie : productivité industrielle maximum d'abord, liée à un utilitarisme d'inspiration benthamienne, accordant aux savants le pouvoir spirituel, et le pouvoir temporel aux industriels-entrepreneurs ; ensuite planification fondée sur la « pyramide industrielle » ayant à sa tête les « chefs des travaux » - une technocratie, par conséquent, mais libérale, car « l'administration des choses remplacera le gouvernement des personnes », et les producteurs-ouvriers devront profiter très largement d'une abondance toujours plus grande ; enfin, dans ses tout derniers ouvrages, Saint-Simon prêche l'union de l'amour et du travail grâce à laquelle les prolétaires deviendront « sociétaires » et « adminis­trateurs », mais sans indiquer les moyens précis qui permettraient d'y parvenir.

Cependant ces changements de doctrine socio-politique, dont le panthéisme humaniste est d'ailleurs explicitement formulé dans le Nouveau christianisme, n'entraînent pas une modification de la théorie proprement sociologique de Saint-Simon, si l'on excepte une plus grande précision dans la différenciation des classes sociales parmi les « producteurs ».

Évidemment, en sociologie, les coefficients idéologiques ne peuvent être éliminés d'aucune théorie, ni même d'aucune recherche empirique. Mais cela est vrai de toute science, qui est toujours une oeuvre humaine et une oeuvre collective. Il ne s'agit que de différents degrés d'intensité de ces coefficients.

Par ailleurs, ils peuvent toujours être diminués étant rendus conscients. L'idéo­logie fluctuante et incertaine propre à la sociologie de Saint-Simon affaiblit plutôt qu'elle n'augmente ce coefficient. C'est ce qui rend cette sociologie particulièrement attirante au point de vue scientifique.


[1] Claude-Henri de Rouvroy, Conde de Saint-Simon, París, 17 de octubre de 1760 - id., 19 de mayo de 1825. Fragmentos extraídos da Introduction de Georges Gurvitch in: " Claude-Henri de Saint-Simon: La physiologie sociale. Œuvres choisies". http://classiques.uqac.ca/classiques/saint_simon_Claude_henri/physiologie_sociale/physiologie_sociale.html

vendredi 21 mars 2008

O CONFORMISMO COMO OBSTÁCULO: perfil de Saint-Simon -3




O CONFORMISMO COMO OBSTÁCULO:
Notas de Microssociologia
Por
Jacob (J.) Lumier


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A teoria sociológica é elaborada com o recurso da dialética para a intervenção do sociólogo e demais profissionais das ciências humanas que em suas atividades sociais regulares se relacionam ao aspecto instituinte da vida social, como as condutas efervescentes que muitas vezes emergem nos diálogos, debates, reuniões, assembléias, etc.

A existência dos conflitos reais entre os aparelhos organizados, as estruturas propriamente ditas e, enfim, a vida espontânea dos grupos desenvolveu a percepção sociológica que relativiza os controles sociais. Vale dizer, não se pode preservar o conceito de instituição como práxis e coisa, como “maneiras de ser” e “jeitos objetivados de se ver” e aí desconhecer a dialética: os atos individuais ou coletivos não se deixam reduzir à objetivação nos conteúdos ou obras de civilização – o direito, a moral e o conhecimento variam em função dos quadros sociais. E mais do que as mudanças estruturadas são exatamente as variações na realidade social que o sociólogo busca e a sociologia explica.

Na mirada pró atuação, nossa disciplina põe em relevo as suas linhas de intervenção positiva para o reconhecimento do individual e para o enriquecimento da vida social dos grupos pela descoberta da realidade social.

Neste sentido sobressai o aproveitamento da noção anti-dogmática de mumificação do discursivo (Ver: Gurvitch, Georges (1894-1965): “Dialectique et Sociologie”, Flammarion, Paris 1962, 312 pp., Col. Science) que inclui a “interiorização das normas” como obstáculo à capacidade instituinte tornando problemático o termo instituição, deste ponto de vista considerado demasiado estreito.

Além disso, autores igualmente praticantes da mirada desdogmatizadora adotaram a recusa da aplicação sociológica de “instituição" como termo cristalizado que se limita a designar o instituído, a coisa estabelecida, as normas já presentes, o estado de fato confundido ao estado de direito, tornando desse modo cada vez mais escondido o aspecto instituinte da vida social (Ver: Lourau, René: ‘A Análise institucional’, tradução Mariano Ferreira, Petrópolis, editora Vozes, 1975, 296 pp. (1ªedição em Francês: Paris, ed. De Minuit, 1970; Ver igualmente: GABEL, Joseph: “Sociología de la Alienación”, trad. Noemi Labrune, Buenos Aires, Amorrortu editores, 1973, 225pp. (1ªedição em Francês, Paris, PUF, 1970).

É claro que se trata de aprofundar nas “fossilizações sociais” que já são constatadas nas análises de Saint-Simon e a partir dele constituem através da noção gurvitcheana de mumificação do discursivo um conceito sociológico abrangendo a psicologia coletiva na sociologia e tendo serventia para verificar justamente os obstáculos à percepção das transformações no interior das estruturas.

Como se sabe, na Phyisiologie Sociale há um trecho definindo as fossilizações sociais como obstáculos ao progresso social e bloqueios à percepção da própria mudança que a atitude afinada com as mudanças deve conhecer não tanto como o seu contrário, mas como seu desafio. No dizer de Saint-Simon, trata-se daqueles entraves observados em um estado coletivo de melancolia e depauperação que conduz ao desaparecimento da vida social à medida que (a) - inibe de resolver-se por um regime ativo, e (b) - corresponde a uma atitude de repugnância à mudança consentindo em grandes sacrifícios para preservar as coisas tais quais são e as fixar em maneira invariável no ponto onde elas se encontram.

Saint-simon se refere a tal estado como uma corrente de opinião estacionária, melhor, estagnada, de natureza puramente passiva, e nostálgica de uma forma de governo equiparável àquelas que duraram tantos séculos sem experimentar nenhum estremecimento geral, como houvera durado o Ancien Régime. Segundo Saint-Simon tal estado de fossilização sendo referido ao Ancien Régime se mostra sempre pronto a reter e fixar o que é sobrevindo para perpetuar o que existe, impelindo à vigília de um esforço inútil os que têm afinidade com as mudanças (Ver “La Physiologie Sociale, págs. 53/55

Desta forma, nas fossilizações sociais somam-se as cristalizações dos modelos e a dogmatização das normas que os reforçam. Daí a importância da desdogmatização do saber para o sociólogo em sua busca das variações na realidade social.

Nada obstante, vê-se igualmente que a compreensão do progresso social como horizonte da sociologia inscreve-se na reflexão de Saint-Simon caracterizando-a como pesquisa dos obstáculos à modernização, de tal sorte que não somente seria válido admitir uma atuação ou intervenção do sociólogo, mas o iniciante em nossa disciplina poderia sentir-se estimulado a sugestionar-se que a intervenção do sociólogo visa acelerar o progresso das mudanças.

Essa inferência seria justa se o obstáculo assinalado nas fossilizações sociais fosse predominantemente de ordem da morfologia social ao invés de revelar-se em meio à trama do organizado e do espontâneo. Menos destoante seria a sugestão de que o sociólogo busca ultrapassar o conformismo, haja vista em Saint-Simon a repugnância à mudança como a atitude que melhor corresponde às fossilizações sociais.

Na verdade, indo ao fundo da modernização, o que Saint-Simon investiga nas fossilizações sociais e que posteriormente veio a ser designado por mumificação do discursivo são os obstáculos à permanência da vida social em mudança permanente. Sendo sociólogo, visou esclarecer nesse seu escrito publicado uma situação penetrada por certo estado coletivo estacionário, estagnado, passivo, a colocar em risco o fluxo da sociabilidade e por isso apreendido como obstáculo.

Portanto, só é legitimo falar de intervenção do sociólogo unicamente em consideração de sua atividade intelectual docente, como publicista, orientador ou aconselhador posto que, com sua mirada treinada para não sublimar os obstáculos à percepção da realidade social, o sociólogo intervém para esclarecer e desanuviar as situações complexas em meio à trama e tensão do plano organizado e do espontaneismo social, inclusive em escala microssocial e no âmbito dos agrupamentos sociais particulares.

Quer dizer, com autonomia em face da atitude ou da mentalidade que lhe possa corresponder em certo quadro social as fossilizações sociais são detectadas na realidade social como obstáculos por elas mesmas e assim são compreendidas pelo sociólogo em cujas análises, sem embargo, são relacionadas às atitudes que lhe correspondem e, se for o caso, inclusive à simbolização de certas condutas significativas para a modernização, como o conformismo, por exemplo, que pode assumir configurações muito variáveis ( A análise da decadência do Estado e do Contrato na passagem para o século XX é caracterizada por Georges Lukacs como “fossilização do liberalismo”ou, mais precisamente, fossilização da ideologia liberal, em referência direta a Saint-Simon, mas contrastando com a análise deste último para o século XIX, onde o quadro social que possibilita a percepção da modernização é a atitude liberal tomada como afinada às mudanças sociais. Ver: ‘Le Roman Historique’, tradução Robert Sailley, prefácio C-E. Magny, Paris, Payot, 1972, 407 pp. [1ªedição em Alemão: Berlim, Aufbau, 1956], capítulos III e IV, pp.190-401).

***

Nessa busca, tendo em conta que as mudanças sociais se verificam em profundidade no interior das estruturas, o sociólogo põe em relevo contra a cultura de massa o empirismo pluralista efetivo que se descobre no estudo das manifestações da sociabilidade, fazendo ver que, malgrado os adeptos do psicodrama, os elementos microssociais não têm absolutamente nada a ver com o individualismo, o atomismo e o formalismo sociais, mas criam inclusive referências objetivas ao mundo dos valores.

Dessa forma, observado, por exemplo, em um sistema de condutas previamente reguladas compreendendo uma ou várias organizações complexas integradas em sociedades mais ou menos penetradas pelo mundo da comunicação social, o conformismo pode ser verificado em uma ambiência microssocial e aparecer como conduta regular afirmando a aceitação em face da recorrência de um ato coletivo tornado instituído como obrigatório.

Quer dizer, a aceitação estacionária – como diria Saint-Simon – neste caso integra um modelo cristalizado em que para impor como obrigatório o ato coletivo inclui em conseqüência certa ordem ou disposição visando dirigir ou bloquear a manifestação efervescente de um Nós instituinte como forma de sociabilidade.

Ora, muito além do psicologismo e da mera acomodação às condutas dominantes preestabelecidas, para compreender essa configuração do conformismo resistindo ao apelo do componente de liberdade em um ato originalmente de escolha multifária deve-se pôr em relevo exatamente no instituído a configuração particular da norma social que reforça e garante a recorrência de tal ato.

Isto porque se constata logo de início que a extensão da cultura de massa alcança somente o estado mental da norma social de reforço, imprimindo a motivação somente psicológica para o conformismo na situação de imposição do patamar organizado sobre um ato em realidade instituinte mas tornado instituído como obrigatório.

Motivação esta resultante do receio de exclusão suscitado pela pressão da maior número, por efeito da qual, sendo compelido ao local ou ambiente do ato instituinte tornado obrigatório e recorrente, os sujeitos individuais aceitam seu comparecimento não por uma razão nem por motivação de um simbolismo, mas em face de uma censura creditando de antemão que “todo o mundo vai” (comparecer).

Portanto, a extensão da cultura de massa explica tão só as manifestações das correntes dos sujeitos individuais em direção ao comparecimento massivo nos locais, uma expectativa do sistema, mas não esclarece nem de longe a vigência de tal ato instituinte tornado obrigatório.

Ora, acontece que, por definição a norma social de reforço ultrapassa o elemento psicossociológico de pressão da massa sobre os indivíduos (receio de exclusão). O estatuto normativo significa a afirmação de valores coletivos não reconhecidos por ultrapassá-lo no elemento constringente do grande número, ainda que a pressão seja potencializada pela Mídia.

Quer dizer é preciso que a norma social de reforço configure os valores previamente aceites cuja afirmação se observa justamente na vigência e na eficácia do regime de um ato instituinte tornado obrigatório em sua não transformação para ato voluntário ou facultativo como seria de esperar no âmbito instituinte.

Há, pois, uma moralidade social particular no conformismo como conduta regular afirmando a aceitação em face de um ato em realidade instituinte mas tornado instituído como obrigatório, moralidade social esta cuja configuração em atitude deve ser explicitada (Ver Lumier, Jacob (J.): A Ficção nas Eleições

***
Ao contrário dos diversos psicologismos muito projetados nas chamadas dinâmicas de grupo, sabe-se que Georges Gurvitch fundou a microssociologia partindo da crítica imanente a Durkheim em modo realista mediante a análise das duas espécies da sociabilidade – por fusão parcial nos Nós e por oposição parcial em um Nós – e desenvolveu a dialética como ligada à experiência pluralista e à variabilidade por exigência da constatação de que nos Nós as relações com outrem não podem ser identificadas nem às fases históricas da sociedade global, nem aos agrupamentos particulares (Ver: Gurvitch, Georges: A Vocação Actual da Sociologia - vol. I: na senda da sociologia diferencial, tradução da 4ª edição francesa de 1968 por Orlando Daniel, Lisboa, Cosmos, 1979, 587 pp. [1ªedição em Francês: Paris, PUF, 1950], pág.286).

E isto é assim porque a diversidade irredutível dos Nós faz com que tais manifestações da sociabilidade por relações com outrem não admita síntese que ultrapasse a combinação variável dessas relações microscópicas.

Quer dizer, mesmo no estado muito valorado pelos estudiosos da história social quando as relações com outrem são distribuídas hierarquicamente e servem de ponto de referência a uma estrutura social (relações com os grupos, relações com o Estado, relações com a classe burguesa, etc.) a síntese não ultrapassa o estado de combinação variável. É pela microssociologia que se põe em relevo a variabilidade no interior de cada grupo, de cada classe, de cada sociedade global.

O sociólogo encontra nos ambientes sociais as Gestalten coletivas onde se tecem os arranjos que levam as unidades coletivas reais (grupos e classes), os Nós no interior destas e as sociedades inteiras a reagirem de maneira comum, a conduzirem-se de certo modo e assumir papéis sociais particulares. Observa ele nesses ambientes sociais os conjuntos cujas configurações implicam um quadro social referenciando os símbolos que se manifestam no seu seio e as escalas particulares de valores que por sua vez aí são aceites ou rejeitadas isto é: as chamadas dinâmicas coletivas de avaliação favorecendo a tomada de consciência dos temas coletivos reais.

Em sua expressão dialética, estas ambiências criadoras manifestam-se nas três escalas dos quadros sociais: a dos Nós (escala microssociológica), a dos grupos e classes (escalas parciais), a das sociedades globais e suas estruturas. Em razão disso, são descritas como “ambientes imponderáveis” que num aparente paradoxo (só aparente) podem ser detectados experimentalmente nos coeficientes de discordância entre as opiniões exprimidas nas sondagens ditas de “opinião pública” e as atitudes reais dos grupos.

Note-se em favor desta constatação experimental, provocada pelas próprias sondagens de opinião, que no realismo sociológico e incluindo as opiniões coletivas, as representações, as conceituações, o nível mental é estudado como sendo apenas um aspecto do conjunto, tanto mais incerto quanto os indivíduos mudam de atitude em função dos grupos ou os personagens que os papéis sociais encarnam mudam segundo os círculos a que pertencem.

Desta forma, para o sociólogo a microssociologia ultrapassa a mera técnica psicologista de estimação dos ajuizamentos de valor portados por cada membro de um grupo sobre cada um dos outros. Aliás, note-se que, desde 1937 (Ver NOTA COMPLEMENTAR), portanto antes de J.L.Moreno e seus colaboradores começarem a associar sua sociometria à microssociologia, insistiu Gurvitch no fato de que "todas as interações, inter-relações, relações com outrem (interpessoais e intergrupais) ou interdependências, pressupunham e eram sempre fundadas sobre interpenetrações, integrações, participações diretas, fusões parciais nos Nós (atuais ou virtuais), sempre concebidos como totalidades”.

Do ponto de vista desta abordagem sociológico-dialética, J.L.Moreno e seus colaboradores famosos pela extraordinária aceitação e penetração do psicodrama e do sóciodrama constituem o esforço de autores que, embora tenham ultrapassado os erros de Hobbes há muito superados, permaneceram parcialmente em desvantagem devido a um psicologismo individualista que os levou a reduzir a realidade social a relações de preferência e de repugnância interpessoais e intergrupais.

As manifestações da sociabilidade incluindo as relações com outrem são definidas pela dialética sociológica como as múltiplas maneiras de ser ligado pelo todo no todo, este último termo compreendendo inclusive o complexo de significações observadas em todo o campo cultural existente. O erro de Hobbes não foi o de ter procurado os elementos microscópicos e irredutíveis de que é composta qualquer unidade coletiva, mas foi, sim, o de encontrá-los fora da realidade social, nos indivíduos isolados e idênticos. Desse modo, se estabeleceu a referência do atomismo social como o conjunto das concepções individualistas e contractualistas que reduzem a realidade social a uma poeira de indivíduos idênticos.

Segundo Gurvitch, a psicologia social de Moreno situa-se ao mesmo nível dos representantes do formalismo social, que promoveram a redução de qualquer sociabilidade à simples interdependência e interação recíproca, cujos nomes mais conhecidos são: Gabriel Tarde, notado por seus debates com Durkheim, Georges Simmel, e Leopold von Wiese. Na limitada orientação desses autores se preconiza que no nível psicológico da realidade social qualquer interesse está concentrado sobre a psicologia interpessoal em detrimento da psicologia coletiva propriamente dita e, por sua vez, J.L.Moreno seguindo a mesma orientação despreza as funções intelectuais e voluntárias, se limita ao aspecto exclusivamente emotivo e, neste, ao aspecto da preferência e da repugnância, deixando de lado o aspecto mais significante que é a aspiração.

Por contra, reconhecendo a imanência recíproca do individual e do coletivo, para o sociólogo não há psicologia interpessoal fora da psicologia coletiva e esta encontra seu domínio dentro da sociologia. Daí a importância do conceito dialético de grupo como atitude coletiva em sociologia envolvendo as mencionadas três escalas dos quadros sociais – a escala dos Nós (escala microssociológica), a dos grupos e classes (escalas parciais), a das sociedades globais e suas estruturas.

(...)

Leia mais:
Lumier, Jacob (J.) (1948 -...):
PSICOLOGIA E SOCIOLOGIA:
O Sociólogo como Profissional das Ciências Humanas
Internet, O.E.I. E-book Monográfico, 158 págs. Janeiro 2008,
Com bibliografia e índices remissivo e analítico eletrônico.
http://www.oei.es/salactsi/lumier2.pdf


NOTA COMPLEMENTAR:
Após haver publicado sua bem reconhecida tese ‘L’Experience Juridique et la Philosophie Pluraliste du Droit’, Paris, A.Pédone e haver sucedido a M. Halbwacs na Universidade de Strasbourg em 1935, Gurvitch publica vários estudos estabelecendo a microssociologia, seguintes: 1936 – ‘Analyse Critique de quelques Classifications des formes de sociabilité’, in Archives Juridiques ; 1937 – ‘Essai d’une Classification Pluraliste des Formes de Sociabilité’, in Annales Sociologiques, serie A, fascículo III ; ‘Morale Théorique et Science des Moeurs : leurs possibilités, leurs conditions’, Paris, Felix Alcan ; - 3ªedição remanejada em 1961 : PUF ; 1938 – ‘Essais de Sociologie : les formes de sociabilité, le probleme de la conscience coletive, la morale de Durkheim’, Paris, Sirey. As versões definitivas desses ensaios reelaborados serão posteriormente inseridas nos dois volumes de ‘La Vocation Actuelle de la Sociologie’ .

dimanche 9 mars 2008

A CRISE ECONÔMICA E A FICÇÃO DO FUTURO: Artigo para a Crítica da Cultura.



A CRISE ECONÔMICA E A FICÇÃO DO FUTURO

Artigo para a Crítica da Cultura

Por

Jacob (J.) Lumier


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Abstract

O universo das altas finanças lembra o discurso da alienação (perda da noção de realidade social) ao fixar o futuro reduzido à incógnita da crise econômica atual como tarefa de “decifrar a faticidade do que não é”, em face do que é válido o esforço coletivo democrático como o pluralismo altermundialista para criar uma referência positiva e recuperar o ponto de vista da realidade social apreendendo o futuro como aspiração e realização desejável [1].

Texto

As pessoas que leram na grande imprensa os comentários sobre o mundo da economia durante a crise das hipotecas nos Estados Unidos, além do irrealismo repetitivo das expectativas do mercado, terão achado engraçado a preocupação dos chamados analistas em utilizar a noção do futuro para designar a incógnita da crise econômica atual, esquecendo o disparate em falar de futuro da crise (sic!).

Não que o irrealismo discursivo do mercado, sua perda de contato com a realidade social, deva ser minimizado pelo humor. Há quem considere um traço democrático das sociedades anônimas saber como os administradores de investimentos imaginam as expectativas sobre as variações nas cotações, embora este imaginário projetivo se satisfaça com a concentração de renda e aplique as balizas preestabelecidas que controlam os preços mas escondem a única expectativa real que é a participação ampliada nos benefícios da produção.

Sem dúvida, o irrealismo discursivo como perda de contato com a realidade constitui um componente crítico estudado por pensadores sociais desde o século XIX.

Assim, por exemplo, em face da constituição da economia política como disciplina separada da sociologia econômica, e relacionando-a com a dominação das alienações, os sociólogos como Karl Marx já observavam que “os economistas burgueses estão impregnados pelas representações características de um período particular da sociedade em que a produção e as suas relações regem o homem ao invés de serem por ele regidas (o período das sociedades arcaicas), em tal modo que a necessidade de certa objetivação das forças sociais do trabalho lhes parece inteiramente inseparável da necessidade da desfiguração desse mesmo trabalho pela projeção e pela perda de si, opostas ao trabalho vivo”.

O irrealismo desde então era constatado no discurso que “acentua não as manifestações objetivas do trabalho, da produção, mas a sua deformação ilusória que esquece a existência dos operários para reter apenas a personificação do capital, ignorando a enorme força objetiva do trabalho que se exerce na sociedade, e que está na própria origem da oposição dos seus diferentes elementos”.

No século XX, com a concorrência sublimada, o indivíduo domesticado e a predominância do “déjà vu” no mundo da comunicação social, o irrealismo assume proporções mais sutis, e o dispositivo de projetar o futuro como perpetuação do sistema é disseminado a contrapelo da modernização e do próprio futurismo.

Nesse contexto, se o futurismo vem a ser afirmado como o estilo e a fantasia da vida urbano-industrial e do progresso desde as primeiras décadas do século XX não está o mesmo imune às confusões do irrealismo. Quer dizer, é segregada uma ideologia do futurismo que desde meados do século XX encobre com o manto do irrealismo o mundo da comunicação social [2].

Tal a situação que enseja o surgimento em sentido contrário da crítica da cultura visando preservar o ponto de vista da realidade social em face das projeções do Sempre Igual da economia regulada e controlada.

Desta sorte, buscando acentuar a redescoberta da realidade social no âmbito do futurismo como expressão autêntica de aspirações coletivas urbanas, sociólogos notáveis procedem pela crítica à desmontagem da ideologia do futurismo projetada desde os anos de 1950 com a fantasia do Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (The Brave New World) [3] .

Com efeito. Theodor W. Adorno nos leva a distinguir vários aspectos da ideologia do futurismo: uns mais interligados à descrição da fantasia, outros representados na formulação conceitual do futuro.

Se exercendo sobre o mundo administrado da comunicação social, a fantasia nada mais consegue do que figurar os prolongamentos de linhas já existentes na civilização técnica compondo, então nesses prolongamentos do Sempre Igual, uma montagem com a ideologia que se afirma inseparável da utopia negativa [4].

Há, pois que empreender a desarticulação dos dispositivos ideológicos para vislumbrar os horizontes da nova sociedade no futurismo, tendo em conta que a qualificação de ideológicos se aplica aos comportamentos motivados por separações fixando-se em alternativas.

A ideologia do futurismo nutre-se dos postulados da filosofia da identidade, nutre-se do idealismo com o seu contraponto na idéia de um Eu genérico idêntico em todos.

O tema da felicidade na visão futurista da nova sociedade produz ali uma cruel e inconciliável alternativa contrapondo “sentido objetivo e felicidade subjetiva”, na qual houvera que decidir entre “a barbárie da felicidade” (sob a standardização e a civilização técnica) por um lado e, por outro lado, “a cultura como estágio objetivamente superior, porém incluindo em si a infelicidade”, posto que, nessa visão ideológica, “a prova da nulidade da felicidade subjetiva significa a nulidade da felicidade em si”.

Theodor W. Adorno assinalará a conseqüência deste dispositivo ideológico do futurismo como projetando colocar no lugar desta “felicidade em si” uma ontologia que, por sua vez, culmina na afirmação de que “a felicidade e o Bem objetivamente supremo são inconciliáveis”, de tal sorte que uma sociedade aspirando somente à felicidade “marcharia inevitavelmente para a animalização mecânica” [5].

Mas não é tudo. Observando os traços não-democráticos que se produzem mediante a fixação das separações em rígidas alternativas na utopia negativa, Theodor W. Adorno destaca que tal alternativa sobre a nulidade da felicidade, sendo combinada a esta outra que separa técnica (no caso a animalização mecânica, o autômato, o robô) e humanidade [6] tem por conseqüência a tese conformista de que a humanidade não deve lutar para escapar à desgraça, estando espremida ante a recaída em uma mitologia (a que se ligam os prognósticos místicos de A.Huxley) e o progresso para “a total iliberdade [7] de consciência” (na animalização mecânica). E nosso autor sentencia: “não sobra lugar para um conceito do homem que não estivera pregado pela constrição sistemática coletiva ou pela contingência do individual”: “o inevitável se produz na utopia negativa”.

Desse modo, para finalizar devemos distinguir o comentário sobre a limitação ideológica da concepção do futuro como tarefa de “decifrar a faticidade do que não é” por meio de prolongamentos do existente combinados a uma lógica corretiva.

A apreciação que Theodor W. Adorno nos passa sobre a noção mesma de utopia já destaca o limite desta noção do futuro como tarefa de decifrar a faticidade do que não é, noção esta que não passa de inevitável recaída na filosofia da identidade, no idealismo.

Desta sorte, mostra-se sempre falha “a irônica correção lógica” que busca sempre A. Huxley nos seus prolongamentos das linhas existentes.

Quer dizer, há um truque nessa notada recaída na filosofia da identidade que leva a preservar oculta a tendência para a irracionalidade. Segundo Theodor W. Adorno, por trás de esse preservar no oculto deve-se distinguir a atitude deificada da grande burguesia ao afirmar soberanamente que defende a sobrevivência da economia do lucro não por interesse próprio, mas por todos os homens; porque “se eles não tivessem que trabalhar tanto como eles têm não saberiam o que fazer com o tempo livre”.

Estamos portanto diante de uma sabedoria de frieza que carece de conteúdo cognitivo por coisificar não o mundo, mas os homens, tomando-os como dados exteriores na medida mesmo em que, nessa relação cognitiva, deifica o observador como instância livre.

Dessa mesma sabedoria fria releva a ficção do futuro, releva o caráter fictício da preocupação com “a desgraça que poderia infringir ao homem a utopia realizada ao desaparecerem do mundo a fome e a ansiedade”.

Quer dizer, essa ficção do futuro por sua vez esconde uma transposição aos que ainda estão por nascer da culpa pelos males do presente, esconde o dogma do sempre foi assim e sempre será igual em que se resume a crença de que: como o homem está manchado pelo pecado original e não é portanto capaz de Bem suficiente na Terra, a mesma melhoria do mundo se deforma em pecado.

E Theodor W. Adorno conclui que o romance de Aldous Huxley fracassa devido à debilidade própria de seu conteúdo efetivo: a indispensabilidade de um esquema vazio inevitável, a saber: a disposição de que (a) – “a transformação dos homens não podendo ser calculada e escapando à imaginação antecipatória”, (b) – adota-se a escolha em substituí-la pela caricatura dos homens de hoje.

***



[1] É à funcionalidade dos valores ideais, sua característica de instrumentos de comunhão e princípios de incessante regeneração da vida espiritual se afirmando indispensavelmente por meio da afetividade coletiva que se refere a utilização do termo desejável. Para Durkheim: qualquer valor pressupõe a apreciação de um sujeito em relação com uma sensibilidade indefinida: é o desejável, qualquer desejo sendo um estado interior. Definição descritiva esta que não só torna extensível a característica do desejável a qualquer valor para além dos valores ideais, mas, por esta via os engloba igualmente na noção de funcionalidade que acabamos de mencionar a respeito desses últimos (qualquer valor tendo assim alguma participação nos ideais).

[2] Sobre o tema do Futurismo veja meu artigo: “Futurismo E Utopia Negativa Na Crítica da Cultura: Elaboração inicial para ler um texto de Theodor W. Adorno”. Link :

< http://docs.google.com/View?docid=ddm5qvxk_31cnt898#sdendnote4sym >

[3] Ver: Theodor W. Adorno: “Prismas: la Critica de la Cultura y la Sociedad”, tradução de Manuel Sacristán, Barcelona, Ariel, 1962, 292 pp. Ver o ensaio “Aldous Huxley y la Utopia”, páginas 99 a 125. (Original em Alemão: Prismen. Kulturkritik und Gesellschaft. Berlin, Frankfurt A.M. 1955). Op. Cit., pp. 268, 269.

[4] Um futuro onde o Sempre Igual se prolonga indefinidamente é compreendido como Utopia Negativa.

[5] Sobre a noção de animal abstrato veja meu artigo: “O Tema do Impacto da Cibernética na Sociedade: Da especialização e do automatismo ao animal abstrato”. Link < http://docs.google.com/View?docid=ddm5qvxk_41f764f2 >

[6] Note-se que, por ser de ordem prático-coletiva, a humanidade não pode ser regulada por prioridades ontológicas.

[7] Como se sabe a noção de iliberdade é utilizada na referência da filosofia de Kant para dar conta da não-incompatibilidade da sua doutrina identitária do Direito em face da coação - conjunto das condições por meio das quais o arbítrio de uma pessoa pode ser acordado com o arbítrio de outra pessoa segundo uma lei universal de liberdade>. A Iliberdade equivaleria à invasão no espaço de outrem (coação) por oposição/complementação da liberdade como esfera da permissão. Ver Power Point Slide 17: Kant e o Direito Link:

www.ucb.br/relinter/download/Norberto%20Bobbio.ppt Pesquisado em 11 de Fevereiro de 2007.

A CRISE ECONÔMICA E A FICÇÃO DO FUTURO

Artigo para a Crítica da Cultura

Por

Jacob (J.) Lumier

FIM


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